segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Carta aberta ao Senhor Presidente Ignácio Lula da Silva, Presidente do Brasil.

Senhor Presidente,

Nós somos responsáveis pelas organizações políticas e populares haitianas. Nosso povo, o povo haitiano, se libertou a 204 anos das cadeia da escravidão. “nos ousamos ser livres”, declarou Jean Jacques Dessalines, no dia 1º de janeiro de 1804, quando ele proclamou esta que foi a primeira República negra do mundo, sendo chamada, então, de Haiti.
Hoje, nosso país é o mais pobre do continente americano. A carência alimentar abrange, diariamente, 3,3 milhões de nossos cidadãos. Uma vítima para cada 3 habitantes. A expectativa de vida para quem aqui nasce é de apenas 51 anos; 60% da população tenta sobreviver a cada dia com menos de dois dólares. Em nosso país, a taxa de mortalidade infantil é de 80 crianças para 1000 que nascem; enquanto que na França a proporção é de 4 crianças entre mil nascidas e na nossa vizinha ilha de Cuba é de apenas 7 para 1000 nascimentos.
Além dessa estatística desoladora, não houve calamidades internas que não se tenha abatido sobre nosso país. Enquanto isso, em revoltante contrapartida, mesmo depois de decorridos 2 séculos que nosso povo conquistou a soberania nacional, os defensores e descendentes dos colonos exploradores e capitalistas não cessaram de querer nos fazer pagar a audácia de termos querido constituir uma nação de homens e mulheres livres.
Nestes últimos decênios, nossa economia, nossa agricultura, nossos serviços públicos, nossos solos, têm sofrido o assalto das privatizações, das multinacionais e de planos de ajustamentos estruturais solicitados pelo FMI e pelo Banco Mundial.
Senhor Presidente, é certo que vós pudestes constatar, quando estivestes aqui em vossa visita oficial em maio último, as devastações causadas por tais políticas das quais os organizadores se encontram fora de nossas fronteiras devastadas, agravadas ainda, há dois meses, pela passagem sucessiva de 4 furacões.
Vós o sabeis. Nosso pobre povo como o povo brasileiro, pagou com sua carne e com seu sangue os decênios de regimes militares e de ditaduras que foram todas sustentadas, mesmo quando não lhe impuseram diretamente o governo dos poderosos. Estes chegaram até a pisotear a soberania da nação Haitiana, como foi o caso da primeira vez da ocupação humilhante de 1915 a 1934, organizada pelo governo dos Estados Unidos da América.
Nenhum povo da história não aceita sem reagir ao ver seu país ocupado; este foi o caso da primeira ocupação estrangeira, como está sendo hoje o caso da presença sobre o nosso solo dos regimentos da MINUSTAH. Estas tropas, sob o comando brasileiro, que em abril último, no momento em que centena de milhares de mulheres e de homens que não tinham mais nada para se comer, foram à rua para se manifestar, as tropas atiraram na multidão matando 6 manifestantes e fazendo centenas de feridos.
Estes regimentos da MINUSTAH que são responsáveis por intervenções as mais graves como em Vila Sol, com um saldo de dezenas de mortes em fevereiro de 2007. Reconhecidamente responsáveis por violações, incitação à prostituição de nossas jovens, etc.... poderiam se prevalecer de estar em nosso solo defendendo uma estabilização e uma paz? Mas Haiti não está em guerra com nenhum outro país. Quem tende a desestabilizar nosso país não são aqueles que lhe negam o direito à sua soberania nacional?
Senhor Presidente, o povo haitiano como todos os povos do Caribe, do continente e do mundo, deve ter o direito imprescindível de dispor de si mesmo, sem ingerência de nenhuma armada, de nenhum poderio, de nenhum governo estrangeiro.
Ele deve ter o direito de tomar a si mesmo as medidas de urgência para salvar seu país da miséria e da violência, para começar a reconstruí-lo. Ele não poderá fazê-lo senão com o restabelecimento da democracia, liberada de toda ocupação, de todo atentado à sua soberania.
O povo haitiano não tem necessidade de militares estrangeiros, não tem necessidade senão da ajuda fraterna de todos os povos irmãos e das organizações trabalhistas, populares e democráticas do Caribe e do continente americano.
Senhor Presidente, nós vos pedimos solenemente que retire as tropas brasileiras do Haiti. E se, como estamos convencidos, vós quereis verdadeiramente ajudar nosso povo buscar o caminho de sua democracia e de uma melhora da situação das massas haitianas, então substitua os 1200 soldados brasileiros por médicos, enfermeiros, bombeiros, técnicos e trabalhadores para reconstruir as estradas e todas as infra-estruturas destruídas pelos furacões.
Nós esperamos também que o Senhor Presidente proponha aos 40 outros países, que têm igualmente tropas na MINUSTAH façam o mesmo. Proponha que os 540 milhões de dólares US, que é o custo anual destes regimentos (cifra publicada no site da MINUSTAH) sejam dedicadas à reconstrução, à ajuda alimentar, à construção de escolas, de hospitais...
Nós abaixo assinados, organizações sindicais, políticas e populares haitianas, encaminhamos esta carta por intermédio de vosso embaixador, a quem nós vamos remetê-la.
Nós lhe pedimos que se faça o nosso intérprete. Pedimos também que vós, Senhor Presidente, aceiteis receber uma delegação de nossas organizações para que nós lhe expliquemos o sentimento e as exigências de nosso povo, que mais do que nunca quer afirmar sua soberania e num primeiro lugar solicita previamente a partida dos regimentos estrangeiros da MINUSTAH.
O povo haitiano, fortificado em suas tradições e nas lutas pela sua soberania, é um fervoroso partidário do estabelecimento das relações de igualdade e de cooperação entre as nações. As relações de submissão não fazem senão multiplicar os conflitos e provocar as guerras.
Pela presente carta, nós informamos que nos dias 12 e 13 de dezembro próximo, nós organizaremos no nosso país, em Porto-Príncipe, um encontro com militantes e cidadãos do continente para debatermos juntos as vias e os meios de recobrar nossa soberania, incompatível com a manutenção das tropas da MINUSTAH.
Aguardando vossa comunicação, receba, Senhor Presidente do Brasil, nossas respeitosas saudações e estejais certo de nosso profundo desejo de lutar até o fim pela soberania de nosso país.

Porto-Príncipe. 1º de novembro de 2008

Tradução do francês por Moema Selma D'Andrea

As organizações abaixo assinadas :
CATH : Centrale autonome des travailleurs haïtiens, Louis Fignolé St Cyr, Secrétaire Général
POS : Parti ouvrier socialiste haïtien, Marc Antoine Poinson, Secrétaire à l’organisation des départements
FESTREDH : Fédération syndicale de l’électricité d’Haïti, Dukens Raphaél, Porte parole
GIEL : Groupe d’Initiative des enseignants de lycées, Léonel Pierre, Secrétaire Général
ADFEMTRAH : Section des femmes de la CATH, Julie Génélus, Secrétaire Générale
GRAHLIB : Grand rassemblement pour une Haïti libre et démocratique, Ludy Lapointe Coordonateur Général
FOS : Fédération des ouvriers syndiqués, Raymond Dalvius, Responsable des relations publiques
Koreken : Coordination Résistance Contre les Ingérences, Jhon Wagner Edol, coordinateur général
UNAPFEH : Union Nationale pour la Protection des Femmes est des Enfants d’Haïti, Itiane DERIVAL, coordinatrice,
ACDIFED : Association Chrétienne des Femmes et des Enfants d’Haït, Sherly MICHEL,
FUNA : Femme Universitaire pour une Nouvelle Alternative, Yvonne PRINTEMPS, secrétaire générale,
FHVC : Femme Handicapée en Voie de Culminance, Kerlange PAULEMA, coordinatrice,
CHASS : Centre Haïtien de Service Social, Robinson DESIRE, secrétaire général adjoin,
GROSSOL : Groupe Solidarité, Ing. Poto Jean MARRAIS, secrétaire général,
ROFNA : Rassembement des Organisations de Femmes pour une Nouvelle Alternative, Nicole D MICHEL, coordnatrice,
FEMHA : Femme Haïtienne en Action, Gina DESIRE, coordinatrice,
AFVS : Organisation Femme Victime de Solino, Luthana AUGUSTE, coordinatrice,
JM : Jeune du Monde, Dukerline DORIVAL, coordinatrice,
RONA : Rassemblement des Organisations pour une Nouvelle Alternative, Ing. Georghy DESIRE, coordinateur général ,
COADMEDH : Coalition des Médecins Haïtiens, Dr Giles Labossière, coordinateur général,
GAPANA : Groupe d’appui pour l’Avancement et la Promotion de la production Nationale,Réginal Rebecca FRANCOIS,
MOFERPNH : Mouvement des Femmes de Rève pour une Nouvelle Haïti, Josy FAIDOR, coordinatrice

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